A Secretaria-Geral Ibero-Americana (SEGIB) apresentou hoje, em Madri, a Guia de recursos, ações e instrumentos para abordar a violência de gênero contra meninas e mulheres com deficiência, uma ferramenta que busca fortalecer as políticas públicas, aprimorar a resposta institucional e promover a igualdade real para todas as mulheres e meninas, com ênfase na dupla discriminação que as mulheres com deficiência sofrem por sua condição de gênero e por sua deficiência.
A Guia de recursos, ações e instrumentos é fruto do trabalho da Iniciativa Ibero-Americana para Prevenir e Eliminar a Violência contra as Mulheres (IIPEVCM) e do Programa Ibero-Americano de Deficiência (PID), dois dos 31 programas de cooperação impulsionados pela SEGIB. Ele reúne a experiência e as políticas de 15 países ibero-americanos — Andorra, Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, Espanha, Guatemala, México, Panamá, Paraguai, Portugal, República Dominicana e Uruguai — para responder à violência exercida contra mulheres e meninas com deficiência.
O documento parte de uma constatação clara: a interseção entre gênero e deficiência aprofunda as desigualdades estruturais, multiplica as barreiras e limita o acesso a direitos fundamentais como justiça, saúde, educação e proteção contra a violência. Seu propósito é fazer com que ser mulher e ter uma deficiência não signifique uma dupla condenação à exclusão ou ao silêncio.
Para destacar essa invisibilidade vivida por muitas mulheres com deficiência, o evento contou com a participação da cantora Rozalén, embaixadora cultural ibero-americana e defensora dos direitos das mulheres, e da jornalista Inés Rodríguez, que conduziram uma conversa com Jesús Martín Blanco, Presidente do Programa Ibero-Americano de Deficiência (PID) y Diretor-Geral dos Direitos das Pessoas com Deficiência do Governo da Espanha, Carmen Martínez Perza, Presidenta da Iniciativa Ibero-Americana para Prevenir e Eliminar a Violência contra as Mulheres (IIPEVCM) y Delegada do Governo contra a Violência de Gênero da Espanha e Clara Sandros, mulher com deficiência, sobrevivente de violência de gênero e participante do programa Mulheres em Modo ON-VG da Fundação ONCE, convidada ao evento.
Durante a conversa, Martínez Perza destacou que “as políticas devem ser interseccionais, precisam superar o enfoque assistencialista e avançar rumo a uma inclusão real. Nossa prioridade deve ser garantir um atendimento verdadeiramente acessível, integral e adaptado às suas necessidades específicas.” Por sua vez, Martín Blanco ressaltou que “as mulheres continuam sendo assassinadas” e que “não se deve aliviar ou suavizar as questões que atentam contra a sobrevivência, a qualidade de vida e o bem-estar das mulheres”. Clara Sandros, vítima de violências, incentivou a denunciar a partir de sua própria experiência pessoal, apesar da dor que isso possa causar.
Uma ferramenta para tornar visíveis as violências invisíveis
Natalia Guala, membro do Comitê sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência das Nações Unidas, apresentou o documento, que busca avançar na implementação da Recomendação Geral nº 4 do MESECVI sobre violência de gênero contra meninas e mulheres com deficiência, identificando desafios comuns em matéria de legislação, políticas públicas, acesso à justiça e geração de dados com enfoque interseccional. O documento também identifica boas práticas replicáveis já implementadas na região:
- Andorra conta com um Protocolo de colaboração interinstitucional para garantir o atendimento integral a mulheres com deficiência em situação de violência.
- Chile criou o Centro da Mulher Surda, que oferece atendimento psicológico, jurídico e social em língua de sinais.
- Argentina tornou acessível sua Linha 144, incorporando atendimento por videochamada com intérpretes de Libras.
- Uruguai promove um serviço especializado para mulheres com deficiência e uma Pesquisa Nacional de Prevalência da Violência Baseada em Gênero, que inclui dados sobre deficiência — pioneira na região.
- Bolívia reconhece em sua Constituição o direito das mulheres com deficiência a viver uma vida livre de violência.
- Espanha aplica medidas específicas de apoio econômico e um procedimento de urgência para o reconhecimento da deficiência em vítimas de violência de gênero.
- México conta com um Sistema Integrado de Estatísticas sobre Violência contra as Mulheres, com mais de 300 indicadores.
- Chile, Uruguai e Argentina desenvolveram guias e protocolos judiciais acessíveis que facilitam o acesso à justiça.
- Portugal e República Dominicana, junto aos demais países-membros, compartilham o compromisso comum de avançar na implementação da Recomendação Geral nº 4 do Comitê de Peritas do MESECVI, centrada na violência contra mulheres e meninas com deficiência.
Como encerramento do evento, Rozalén, acompanhada por Beatriz, sua intérprete de língua de sinais, apresentou “La Puerta violeta”, uma canção que, como a própria cantora admitiu, apesar dos anos, “continua sendo atual”. “Por mais que eu adore minha canção, nossa canção, tomara que um dia ela seja cantada como uma lembrança do que não deve mais acontecer”, afirmou.
O ato contou também com a presença de Patricia Sanz, vice-presidenta terceira do Grupo Social ONCE, e de Federico Ludovice, Secretário-Adjunto Ibero-Americano.

