Coluna originalmente escrita para o jornal El Tiempo, 06/03/2020
Quem não conhece alguma mulher ibero-americana que teve de deixar seu trabalho porque a sociedade não está organizada para poder conciliar a vida profissional com a familiar? Ou alguma que, por seu gênero, foi excluída de determinados empregos ou discriminada pela segurança social ou a lei de herança?
Eu vivi isso em minha própria pele. Para mim, chegar às posições de liderança que ocupei foi muito desafiante porque, da mesma forma que para muitas outras mulheres, devemos fazer o dobro para que se reconheça a metade e porque se exige uma disponibilidade que não considera um aspecto elementar da vida humana: a família.
Ainda que em muitos lugares da Ibero-América tudo isto continue ocorrendo, tive a sorte de ser testemunha e promotora da mudança. Nas últimas décadas a região conseguiu importantes avanços para garantir os direitos das mulheres e se aproximar à igualdade de gênero.
Todos os países ibero-americanos ratificaram a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher. Muitos deles modificaram suas constituições e seus códigos civis, criaram ministérios ou institutos de assuntos da mulher, estabeleceram quotas para os cargos políticos e tipificaram a violência de gênero como um delito.
Graças ao sistema de quotas, por exemplo, a América Latina se situa entre as regiões do mundo com melhores resultados quanto à representação de mulheres em governos e parlamentos.
Um destes pontos de pressão é mudar as leis abertamente discriminatórias para a autonomia das mulheres e, entre elas, aquelas que impedem ou limitam seu empoderamento econômico.
Todos os estudos demonstram que a participação ativa das mulheres na economia contribui à erradicação da pobreza e ao crescimento inclusivo. Segundo um relatório do McKinsey Global Institute, se as mulheres tivessem a mesma participação e o mesmo salário por trabalho equivalente aos homens nos mercados de todo o mundo, para 2025 poderiam ser agregados, a cada ano, até 28 bilhões de dólares (26%) ao PIB global.
O exemplo da Colômbia
Na Secretaria-Geral Ibero-americana (SEGIB) estamos trabalhando junto com a ONU Mulheres para promover a eliminação da legislação discriminatória na Ibero-América; há leis que devemos derrogar, outras que temos de reformar e outras que, sem dúvida, devemos promover.
Como primeiro passo elaboramos um relatório que analisa quais são os principais obstáculos e desafios no marco legal para o empoderamento econômico das mulheres na região.
Em cada país da Ibero-América há, em média, duas leis que diferenciam homens e mulheres quanto ao emprego, os salários, as condições laborais e os empreendimentos. Por exemplo: 65% dos países ibero-americanos contam com normas que restringem a escolha de trabalhos por parte das mulheres, por considerá-los perigosos, moralmente inapropriados ou pesados.
Durante a Cúpula Ibero-americana celebrada em La Antigua (Guatemala) em novembro de 2018, os Chefes de Estado e de Governo comprometeram-se a trabalhar para mudar esta realidade.
Cabe destacar que a Colômbia é, em nossa região, um dos exemplos a seguir em matéria de leis que combatem a discriminação, promovem a autonomia e empoderam as mulheres.
Ali, segundo precisa nosso reporte dedicado a esse país, a igualdade de gênero e a proteção da maternidade estão consagradas na Constituição. Ainda assim, várias normas garantem que as mulheres tenham livre escolha de emprego, igualdade salarial e benefícios da segurança social, além de reconhecer a contribuição do trabalho doméstico não remunerado no desenvolvimento econômico do país.
O forte compromisso da vice presidenta Marta Lucía Ramírez na luta pela igualdade de gênero e o apoio que, para isso, recebeu do presidente Iván Duque se reflete nestes dias em um foro internacional de alto nível que seu governo acolhe em Bogotá, onde explicaremos nosso trabalho para eliminar as leis discriminatórias na Ibero-América e apresentaremos nosso relatório sobre os avanços da legislação colombiana nessa matéria.
Casos como o da Colômbia nos recordam que não devemos subestimar as conquistas alcançadas e que a região pode, legitimamente, reclamar uma liderança a nível global, ainda que agora o desafio é fazer com que se cumpra o marco normativo e passar da norma à igualdade real.
Acreditamos na necessidade de impulsionar uma coalizão de países ibero-americanos comprometidos com a eliminação de leis discriminatórias para o empoderamento econômico das mulheres, agora que se cumprem 25 anos da Declaração e Plataforma de Ação de Beijing, o programa mais visionário jamais acordado pela igualdade de gênero.
É claro que, para não perder a iniciativa, devemos continuar apoiando o ativismo que alcançou tantas conquistas e, ao mesmo tempo, promover uma grande aliança entre governos, parlamentos, empresas e instituições que alavanque e respalde as transformações.
Só assim poderemos nos assegurar de que, tanto no presente como no futuro, nenhuma mulher tenha de enfrentar estas barreiras somente pelo fato de ser mulher e que a conciliação entre trabalho e família seja uma realidade para todos os homens e mulheres.
Esta deve ser uma luta de toda a sociedade porque, em definitiva, a igualdade nos beneficia a todos.
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